segunda-feira, 14 de novembro de 2011

Relato de estágio de agronomia no Rio Grande do Sul - 1961

Janeiro a Fevereiro de 1961 - Estágio no Ministério da Agricultura-Departamento Produção Vegetal em Porto Alegre (RS) e no Posto Agropecuário  em Carazinho(R.S).
O então ministro da Agricultura do Brasil, Renato Costa Lima (engenheiro agrônomo) do Departamento de Produção Vegetal do Ministério, fez convênio com o CALQ (Centro Acadêmico Luiz de Queiroz) da ESALQ-Piracicaba para contratar estudantes de agronomia para realizar estágio no Brasil. Fez também convênios com todas as escolas de agronomia do Brasil com o objetivo de treinar e capacitar os engenheiros agrônomos em agronomia nas diversas regiões do país. Assim os estagiários das escolas do norte vieram para o sul e os do sudoeste para o norte, tendo em vista a ampliação dos horizontes científicos.    
O Ministério mandou as passagens aéreas e os estagiários seguiram viagens para todos os rincões do  país. Inicialmente foram contratados os estudantes das últimas séries, mas como já eram férias havia poucos colegas dos últimos anos e o CALQ aceitou as inscrições de alunos desde o primeiro ano que estavam na cidade e praticamente todos eram piracicabanos.
Fomos ao aeroporto Congonhas em São Paulo e segui viagem com mais quatro colegas especificamente para o Rio Grande do Sul, onde tinha escolhido.  Lá no Departamento de Fomento Agrícola de Porto Alegre, encontramos com um estagiário da ENA (Escola Nacional de Agronomia) e outro da Escola Superior Federal de Agronomia do Ceará.
Em Porto Alegre fomos recebidos pelo Diretor,  deste Departamento, que procurou saber o objetivo do estágio e depois programou conosco as visitas para conhecermos o maior número de locais e atividades ligadas à agricultura  e pecuária do Rio Grande do Sul.
Primeiramente fomos levados à fábrica de tratores e implementos da Masey Ferguson          para conhecermos os métodos e  a fabricação de implementos agrícolas. Depois fomos para as instalações da SANRIG (Sociedade Algodoeira do Nordeste do Rio Grande do Sul) onde conhecemos o método de industrialização, recebemos amostras das primeiras margarinas e de soja e outros produtos derivados da soja que estava em começo de produção no Brasil. Experimentamos os produtos e notamos que a qualidade dos derivados de soja era bem melhor do que as vendidas em São Paulo.
  Após a visita da SANRIG, fomos á Estação experimental do IRGA (Instituto Rio Grandense de Arroz) do Ministério da Agricultura em Viamão na Grande Porto Alegre para conhecermos os novos cultivares de arroz do Instituto. Eles tinham produtividade de até 10.000 quilos por hectare em “quadra” alagada e com água corrente. Vimos no IRGA os primeiros usos de herbicida seletivo - Stam F34 - em arroz inundado, em quadra, com grande sucesso.
A seguir fomos levados ao “Banhado do Colégio” onde estava ocorrendo uma das primeiras experiências de Reforma Agrária no Rio Grande do Sul, implantada pelo Governo Leonel Brizola do PTB- RS numa  fazenda desapropriada na área drenada da Lagoa dos Patos que tinha sido invadida pelos vizinhos da área drenada.  Ali seria cultivado arroz irrigado pelos colonos selecionados pelo Instituto Riograndense de Reforma Agrária (IRGRA).

Depois fomos para o Posto Agropecuário de Carazinho que  funcionava numa fazenda dirigida por um engenheiro agrônomo, com todas as condições para receber estudantes, profissionais e agricultores para treinamento, bem como para servir de apoio de mecanização e conservação do solo, para agricultores dos municípios entorno do Posto.
Fomos visitar, com o engenheiro agrônomo responsável deste PAP, o “Moinho de Trigo de Não Me Toque” do Ministério da Agricultura e várias fazendas de soja no entorno do posto e em Passo Fundo onde vimos os serviços de terraceamento de base larga com desnível para a faixa de descarga gramadas, do  excesso de água  nas chuvas pesadas nos solos vermelhos e argilosos (latossóis) da região, para evitar erosão e permitir a colheita mecanizada .
Era notável a influência do Posto, que era todo conservado com terraços de base larga, e com desnível para saída das águas residuais de chuvas, bem como a organização e manutenção das instalações do PAP pelo engenheiro agrônomo que tinha verbas limitadas e complementadas com a produção e venda  de sementes de pensacola, soja, trigo,e outras forrageiras de inverno.
Esta demonstração de conservação do solo e os serviços de máquinas executados por operadores do Posto se espalharam pelas fazendas de Carazinho e Passo Fundo, com terraços de base larga, em praticamente todas as propriedades que plantavam soja-trigo. Isto deixou a nós estudantes – estagiários impressionados pela  adoção da  técnica por todos na região já 1961!!! Também soubemos pelo engenheiro agrônomo que eram feitas demonstrações e implantação de conservação do solo com as máquinas e implementos do PAP de Carazinho. Além disso, este Posto prestava serviço para a construção e manutenção das operações de Conservação do solo das fazendas do município e seus arredores.   
Como as verbas de manutenção do Ministério no começo do ano demoravam a chegar o chefe do Posto nos dividiu em equipes e nos incumbiu de realizar os trabalhos rotineiros  de colheita da grama “pensacola bahia grass”(grama para pastoreio), cornichão e também arar,  gradear as terras para o preparo de plantio de inverno das áreas do PAP. 
As refeições e alojamentos eram fornecidos pelo Posto nas instalações que já existiam para tal, praticamente com verbas geradas pelo próprio Posto.
O engenheiro agrônomo Chefe se desdobrava e conseguia visitas às melhores fazendas que plantavam trigo e soja na região, sendo que todas elas tinham conservação do solo; terraços e quebras-vento em torno das construções e benfeitorias em todas as propriedades visitadas devido ao clima com inverno rigoroso. 
Também possibilitou que nós praticássemos a aração, gradeação em toda a área a ser plantada no inverno/verão; que fizéssemos a colheita de sementes (de capim), a prática da manutenção e abastecimento dos equipamentos nas oficinas do PAP e pelo que observamos nunca antes visto pelos estagiários e estudantes de agronomia.  
Todos os estagiários de escolas de agronomia de São Paulo ao Rio Grande do Norte, com quem estive ficaram  entusiasmados com as técnicas e avanços da agricultura do Rio Grande do Sul ( terraços, faixas de retenção,quebra-ventos plantados, aração com reversível, plantio de arroz irrigados por inundação, colheita mecanizada com colheitadeiras automotrizes, secagem das quadras inundadas para colheita do arroz) e gados de raças européias tipo Aberdeen Angus , Polled Angus, Hereford, e outras.   
Ao término do estágio, os estudantes-estagiários estavam ansiosos para chegar o mais rápido possível às suas casas. Ficamos sabendo que havia um avião de aluguel - um antigo DC2-Douglas - no aeroporto de Passo Fundo com destino à Porto Alegre. Assim, contratamos este avião para voltar para Porto Alegre. Junto com nós - sete estudantes de agronomia- foi  um senhor doente com soro instalado e enfermeiro, com destino ao Hospital Geral de Porto Alegre. E lá fomos nós, sentados em poltronas improvisadas, ao lado do doente terminal, para mais uma experiência de vida.
A viagem foi tranqüila e chegando á Porto Alegre fomos ao Departamento de Produção Vegetal  (PDV) nos despedir após receber os valores do nosso estágio. À noite fomos conhecer a vida noturna portoalegrense e dormir na Casa do Estudante na rua da “Praia” até o dia da viagem para São Paulo.
 O estágio foi útil e benéfico para todos nos, pois tínhamos pouco ou nenhum conhecimento da técnica de plantio de arroz irrigado em quadras irrigáveis, do capim pensacola, e  nenhum de nos tínhamos visto terraços de base larga com plantio e colheita em cima desses terraços, e em desnível, poucos tinham operado e visto arado reversível e a colheitadeira automotriz. Além disso,  poucos de nós conhecíamos Porto Alegre e seus arredores, e assim cacabamos por ampliar nossos horizontes sobre a agricultura nacional e o Brasil .   
 Comparamos a ação de extensão  rural deste Posto com o da Fazenda  Ipanema, localizada em Iperó, na época pertencente á Sorocaba S.P.,   também do ETA,  com instalações, máquinas e equipamentos semelhantes.  A diferença é que em Carazinho  havia uma agricultura empresarial e técnica nas vizinhanças e houve absorção da tecnologia de mecanização e conservação do solo.  
 Faço essas considerações  com base em minha participação no curso de treinamento em conservação do solo promovido pela Secretaria da Agricultura na década de setenta e no Projeto de Microbacias Hidrográficas na década de oitenta –noventa. 

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